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GRAMOFONE

às voltas com os discos às voltas.

GRAMOFONE

às voltas com os discos às voltas.

Massive Attack @ Campo Pequeno - Querida, encolhi o mezanino.

QUERIDA, ENCOLHI A MEZANINO.

Vinte anos após o lançamento de "Mezzanine" e do concerto da respectiva tour, que teve a honra de inaugurar o Pavilhão Atlântico no que toca a concertos, os rapazes de Bristol regressavam para homenager o referido álbum com uma actuação onde apenas caberiam esses temas, além duma mão cheia de versões. 

Os covers em questão, desde Ultravox a The Cure, passando por Bauhaus, tinham como missão honrar temas que foram samplados pelos Massive Attack durante a feitura de "Mezzanine". E se a ideia até parecia interessante no papel, a prática revelou-se algo desastrosa, no sentido em que as versões que ecoaram neste concerto respeitaram bastante os originais, o que automaticamente significa que saíram estrondosamente de todo o habitat que "Mezzanine" construiu. Este facto impediu que o ambiente denso, negro e fumegante do disco nunca fosse propriamente reproduzido, até porque o alinhamento consiste em intercalar as composições originais da banda com os referidos covers. Era como estar a ouvir "Mezzanine" num quarto escuro e alguém abrir a porta e ligar as luzes no final de cada tema. Aliás, o início do concerto foi especialmente desconexo, com 3D a pegar nos sintetizadores durante uns minutos, criando um ambiente ruidoso e típico de Massive Attack para, de repente, a banda entoar "I Found a Reason" dos Velvet Underground e tornar-se num banal agrupamento de pop-rock durante essa interpretação. Ao invés do que normalmente sucede em concertos de Massive Attack, tornou-se impossível mergulhar na atmosfera que projectam nas suas canções, algo que costuma levar-nos numa viagem em estado de transe que atravessa toda a actuação. "Black Milk" e a derradeira "Group Four" terão sido os únicos momentos em que a audiência conseguiu agarrar o sentimento que "Mezzanine" emana e embalar por essa estrada nocturna e aterradora. Foram também os dois melhores momento de Elizabeth Fraser, que também não teve a melhor prestação, com especial destaque para o falhanço quase total que foi a voz em "Teardrop". 

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A qualidade do som na arena deixou algo a desejar também, estando o volume excessivamente baixo durante as músicas iniciais, e não permitindo em muitas outras escutar convenientemente as vozes dos diferentes protagonistas. As vozes de 3D então estiveram sempre bastante indistintas. Curiosamente, na recta final testemunhámos que o som estava bem mais nítido numa das laterais, e foi aí que permanecemos durante os minutos finais da noite. 

A parte visual, que desempenha sempre um papel relevante nas actuações da banda de Bristol, deixou igualmente muito a desejar. Pareceu meio desconchavada, as mensagens fortes que geralmente transmitem foram substituídas por pensamentos genéricos e soltos, e apenas quando surgiu a carantonha de Trump, já na segunda metade do concerto, a plateia reagiu (só voltaria a reagir quando foi projectada uma breve image de Kurt Cobain, bem no final da noite). Apesar de se perceber o sentido das ideias que querem fazer passar, as projecções não necessitavam de ser tão explícitas para chocar e fazer pensar, até porque as palavras costumam ter o mesmo ou mais poder quando bem gizadas. 

Foi um tiro quase ao lado por parte duma banda que nos habituou ao melhor dos mundos. Não que a execução dos temas de “Mezzanine” tenha sido precária, embora lhe tenha faltado algum poderio, mas o facto de misturar com canções de terceiros, sem sequer as adaptar ao universo Massive Attack, empobreceu claramente um concerto que tinha tudo para ser histórico.